sábado, 12 de novembro de 2016

Descobertas novas evidências de atividade geológica recente na superfície de Ceres

Perspetiva sobre Ahuna Mons, uma montanha misteriosa localizada no hemisfério sul de Ceres.
Crédito: NASA/JPL/Missão Dawn.

Uma doma vulcânica com 4 km de altitude e 17 km de largura, uma fina atmosfera temporária, gelo de água e filossilicatos expostos na superfície de Ceres! Estas são apenas quatro das mais recentes descobertas da missão Dawn divulgadas no passado mês de setembro em seis artigos publicados na revista Science. "A Dawn revelou que Ceres é um mundo diverso, que claramente teve atividade geológica no seu passado recente", disse Chris Russell, investigador principal da missão da NASA na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos.

Uma das novidades mais surpreendentes foi a provável deteção de uma fina atmosfera temporária junto à superfície de Ceres. Usando o instrumento GRaND (Gamma Ray and Neutron Detector), a sonda da NASA observou evidências de que o planeta anão acelerou eletrões do vento solar até energias muito altas (dezenas de volts) ao longo de um período aproximado de seis dias. Em teoria, este fenómeno poderá ser explicado pela interação entre as partículas energéticas do vento solar e moléculas contituintes de uma fina atmosfera.

Esta observação é consistente com as assinatura espetrais de vapor de água detetadas em 2013 junto à superfície de Ceres pelo observatório espacial europeu Herschel. Os eletrões detetados pelo GRaND poderão ter sido produzidos pela colisão entre partículas do vento solar e as moléculas de vapor de água observadas pelo Herschel, contudo os cientistas continuam também à procura de explicações alternativas. "Estamos muito entusiasmados por acompanhar esta e outras descobertas sobre este mundo fascinante", comentou Russell.

Mapa topográfico de Ahuna Mons.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/UCLA/MPS/DLR/IDA.

Outra novidade fascinante foi a descoberta de evidências de que Ahuna Mons é uma doma vulcânica diferente de qualquer outra até agora observada no Sistema Solar. Realizada por uma equipa de investigadores liderada por Ottaviano Ruesch do Centro de Voo Espacial de Goodard da NASA, nos Estados Unidos, esta descoberta teve como ponto de partida a análise detalhada da morfologia de Ahuna Mons e a sua comparação com estruturas semelhantes e com modelos que descrevem os processos orogénicos que conduzem à formação de montanhas na Terra e em Marte.

De acordo com a equipa, as fendas e escarpas do topo de Ahuna Mons, bem como os lineamentos observados nos seus flancos, sugerem que esta montanha é uma gigantesca doma vulcânica formada pela extrusão de materiais fundidos com uma elevada viscosidade, provenientes do interior de Ceres. Estes materiais seriam provavelmente fluídos criomagmáticos constituídos por misturas de argilas e compostos voláteis como a água. "Estamos confiantes que Ahuna Mons se formou nos últimos milhares de milhões de anos, e possivelmente nas últimas centenas de milhões de anos", disse Ruesch. "Ahuna Mons está a informar-nos que Ceres tem ainda calor suficiente para produzir um criovulcão relativamente recente."

Ahuna Mons poderá ter explido água líquida no passado, no entanto a Dawn também detetou depósitos superficiais de água no presente, como se encontra descrito no estudo liderado por Jean-Philippe Combe do Instituto Bear Fight, nos Estados Unidos. Usando dados do instrumento VIR (Visible and Infrared Mapping Spectrometer), Combe e colegas identificaram materiais com um espetro de absorção semelhante ao do gelo de água no interior da cratera Oxo, uma depressão inclinada com cerca de 10 km de diâmetro, localizada nas latitudes médias de Ceres.

A cratera Oxo vista pela sonda Dawn.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/UCLA/MPS/DLR/IDA/PSI.

A localização de Ceres torna improvável a exposição de depósitos gelo de água por longos períodos na superfície, contudo a baixa densidade do planeta anão, os fluxos gerados por impactos e a própria existência de Ahuna Mons sugerem que a crusta de Ceres contém uma percentagem significativa de gelo de água. Isto é consistente com os dois estudos publicados no mesmo número da Science sobre a diversidade de crateras e de outras formações geológicas em Ceres - o primeiro pertencente a uma equipa liderada por Harald Hiesinger da Universidade de Münster, na Alemanha, e o segundo conduzido por outro grupo de investigadores liderado por Debra Buczkowski do Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos.

As crateras de impacto são claramente as estruturas dominantes na superfície de Ceres, e as suas diferentes formas contribuem para o esclarecimento das principais fases que dominaram a intricada evolução geológica do planeta anão. As crateras que são aproximadamente poligonais - isto é, cuja sua forma é delimitada por linhas retas - sugerem que a crusta de Ceres se encontra fortemente fraturada. Isto encontra-se de acordo com os padrões de fraturas observados no chão de algumas crateras cererianas.

Algumas crateras, como a pequena Oxo, têm terraços no seu interior, enquanto que outras, como a grande cratera Urvara (cerca de 170 km de diâmetro), exibem picos centrais. Existem crateras com formações semelhantes a fluxos, crateras que se sobrepõem a outras crateras e cadeias de pequenas crateras. Existem também várias áreas brilhantes espalhadas pela superfície de Ceres, sendo as mais refletivas as que se localizam no interior da cratera Occator. As formas de algumas crateras podem indicar a presença de gelo de água logo abaixo da superfície.

No geral, a variedade morfológica das crateras de impacto de Ceres sugere que o planeta anão possui uma camada externa formada por uma mistura de gelo de água e rochas - uma conclusão partilhada por outros estudos. A razão entre a profundidade e o diâmetro de várias crateras indica ainda que as crateras cererianas sofreram algum grau de relaxamento desde a sua formação. Adicionalmente, existem mais crateras no hemisfério norte de Ceres do que no sul, onde as grandes crateras Urvara e Yalode são as formações dominantes. "A distribuição desigual de crateras indica que a crusta não é uniforme e que Ceres passou por uma evolução geológica complexa", disse Hiesinger.

Abundância de filossilicatos e do catião amónio na superfície de Ceres. Os dois mapas mostram padrões de distribuição global semelhantes, diferindo apenas em algumas regiões localizadas como é o caso de Urvara. A escala é válida apenas para o equador.
Crédito: Ammannito et al., 2016.

E os materiais rochosos? Quais serão os mais comuns na crusta de Ceres? Um estudo liderado por Eleonora Ammannito da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos permitiu verificar que a superfície do planeta anão é dominada pela presença de minerais argilosos denominados filossilicatos. Os filossilicatos de Ceres são ricos em magnésio e têm também algum amónio (NH4+) embebido na sua estrutura cristalina. A sua distribuição ao longo da crusta do planeta anão indica que os materiais expostos na superfície de Ceres foram alterados por um processo global que envolveu água.

Embora os filossilicatos de Ceres possuam uma composição uniforme, existem diferenças importantes na abundância destes materiais à superfície. Por exemplo, os filossilicatos são especialmente prevalentes na região que rodeia a cratera Kerwan (280 km em diâmetro), uma bacia de impacto relativamente plana, com uma morfologia semelhante à de uma "panqueca", e menos prevalentes junto à cratera Yalode (260 km em diâmetro), que tem áreas tanto de terreno liso como de rugoso em seu redor. Uma vez que Kerwan e Yalode têm dimensões semelhantes, isto poderá significar que a composição dos materiais que originalmente se encontravam no local do impacto seria diferente.

As crateras Dantu e Haulani foram ambas formadas recentemente, em termos geológicos, mas parecem também possuir composições distintas. "Através da comparação de crateras como Dantu e Haulani descobrimos que as suas diferentes misturas de materiais podem prolongar-se para as camadas abaixo da superfície durante quilómetros, ou até dezenas de quilómetros, como no caso da maior, [a cratera] Dantu," explicou Ammannito.

Os resultados destes 6 estudos estiveram em destaque no número 6303 da revista Science e podem ser encontrados aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

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