Sikhote-Alin, um meteorito de ferro rico em schreibersito.
Crédito: Mila Zinkova.
Os cientistas concordam que o intenso bombardeamento de material meteorítico a que a Terra foi sujeita nos primórdios da sua formação foi fundamental no surgimento dos primeiros organismos vivos. Encerrado no interior dos meteoritos encontra-se um imenso inventário de ingredientes essenciais para a vida, que inclui não só uma variedade de compostos orgânicos, como também elementos metálicos (ferro e níquel) e não metálicos (carbono, enxofre, azoto e fósforo) determinantes para o funcionamento do metabolismo celular. Infelizmente, até hoje, não foi possível explicar de forma convincente como é que estes elementos fizeram a transição da rocha inanimada para as moléculas biologicamente activas encontradas nos sistemas vivos.
Uma parte importante deste enigma poderá ter sido agora desvendada por um grupo de investigadores ingleses. Num estudo recentemente publicado na revista Geochimica et Cosmochimica Acta, David Bryant e colegas demonstraram como a pirofosfite, um composto químico semelhante ao pirofosfato, um bloco fundamental na construção da moeda energética da célula, a adenosina trifosfato (ATP), pode ser gerado em meteoritos ricos em fósforo expostos a fluídos hidrotermais ácidos, como os que são encontrados em muitos sistemas vulcânicos activos.
Estrutura molecular do ATP (código de cores: amarelo - fósforo, vermelho - oxigénio, cinzento - carbono, azul - azoto e branco - hidrogénio).
Crédito: Sérgio Paulino (construída com o software Avogrado).
Todos os processos biológicos dependem directamente da disponibilidade do ATP como transportador de energia química no interior da célula. A complexidade da maquinaria celular usada na sua criação e no seu consumo sugere que esta molécula não deveria existir nos primórdios da formação da Terra, quando os primeiros organismos vivos emergiram, pelo que os cientistas têm procurado uma molécula mais simples com propriedades semelhantes, mas sem a necessidade da intervenção de enzimas para o desempenho das suas funções.
O fósforo (P) é o elemento chave no ATP e noutras moléculas essenciais à vida, como por exemplo o ácido desoxirribonucleico (ADN). No entanto, a forma como este elemento ocorre na actualidade na superfície terrestre, a forma inteiramente oxidada, o fósforo (V), tem uma solubilidade limitada na água e uma baixa reactividade química. Como é que teriam surgido, então, na Terra formas quimicamente activas de fósforo? Uma fracção importante dos materiais meteoríticos e das poeiras interestelares que colidiram com a Terra no Hadeano continham minerais ricos em formas quimicamente mais reactivas de fósforo, como por exemplo o schreibersito, (Fe,Ni)3P, um mineral comum nos meteoritos de ferro.
Partindo deste pressuposto, Bryant e colegas simularam o impacto de um destes objectos numa fonte hidrotermal ácida, um sistema vulcânico certamente comum nos primórdios da formação do nosso planeta. Para realizarem esta experiência, os investigadores obtiveram amostras do meteorito de Sikhote-Alin, um meteorito de ferro rico em schreibersito que caiu na Sibéria em 1947, e expuseram-nas durante 4 dias aos fluídos geotermais ácidos de Hveradalur, na região vulcânica de Kverfjöll, na Islândia, seguidos de uma incubação de 30 dias no laboratório à temperatura ambiente. Análises realizadas à solução resultante revelaram a presença de pirofosfito [PPi(III)], uma molécula estrutural e funcionalmente semelhante ao pirofosfato [PPi(V)], a fracção do ATP responsável pela transferência de energia.
As moléculas pirofosfito (A) e pirofosfato (B).
Crédito: Sérgio Paulino (construídas com o software Avogrado).
Os autores deste trabalho sugerem que este composto poderá ter funcionado como uma forma pré-biótica plausível de moeda energética, usada nos processos químicos no interior das primeiras protocélulas. Ao contrário do ATP, a reactividade do pirofosfito não estaria limitada pela presença de sofisticados processos catalíticos.
David Bryant e os seus colegas da Universidade de Leeds, coautores deste estudo, estão neste momento a colaborar com uma equipa de investigadores americanos do Instituto de Tecnologia da Califórnia, para compreenderem como estas baterias químicas primitivas e os sistemas pré-bióticos onde estavam integradas, evoluíram para os primeiros sistemas biológicos complexos. Nesta nova fase deste trabalho, os investigadores vão não só usar nas experiências novos minerais e gases comuns nos primórdios da Terra, como também aplicar novos compostos químicos à superfície das amostras do meteorito e monitorizar as reacções químicas e os produtos resultantes. A equipa espera ainda repetir a experiência na ilha Disko, na Gronelândia, o único local da Terra onde é possível encontrar schreibersito.
Podem ler mais pormenores sobre este trabalho aqui.
Crédito: Mila Zinkova.
Os cientistas concordam que o intenso bombardeamento de material meteorítico a que a Terra foi sujeita nos primórdios da sua formação foi fundamental no surgimento dos primeiros organismos vivos. Encerrado no interior dos meteoritos encontra-se um imenso inventário de ingredientes essenciais para a vida, que inclui não só uma variedade de compostos orgânicos, como também elementos metálicos (ferro e níquel) e não metálicos (carbono, enxofre, azoto e fósforo) determinantes para o funcionamento do metabolismo celular. Infelizmente, até hoje, não foi possível explicar de forma convincente como é que estes elementos fizeram a transição da rocha inanimada para as moléculas biologicamente activas encontradas nos sistemas vivos.
Uma parte importante deste enigma poderá ter sido agora desvendada por um grupo de investigadores ingleses. Num estudo recentemente publicado na revista Geochimica et Cosmochimica Acta, David Bryant e colegas demonstraram como a pirofosfite, um composto químico semelhante ao pirofosfato, um bloco fundamental na construção da moeda energética da célula, a adenosina trifosfato (ATP), pode ser gerado em meteoritos ricos em fósforo expostos a fluídos hidrotermais ácidos, como os que são encontrados em muitos sistemas vulcânicos activos.
Estrutura molecular do ATP (código de cores: amarelo - fósforo, vermelho - oxigénio, cinzento - carbono, azul - azoto e branco - hidrogénio).
Crédito: Sérgio Paulino (construída com o software Avogrado).
Todos os processos biológicos dependem directamente da disponibilidade do ATP como transportador de energia química no interior da célula. A complexidade da maquinaria celular usada na sua criação e no seu consumo sugere que esta molécula não deveria existir nos primórdios da formação da Terra, quando os primeiros organismos vivos emergiram, pelo que os cientistas têm procurado uma molécula mais simples com propriedades semelhantes, mas sem a necessidade da intervenção de enzimas para o desempenho das suas funções.
O fósforo (P) é o elemento chave no ATP e noutras moléculas essenciais à vida, como por exemplo o ácido desoxirribonucleico (ADN). No entanto, a forma como este elemento ocorre na actualidade na superfície terrestre, a forma inteiramente oxidada, o fósforo (V), tem uma solubilidade limitada na água e uma baixa reactividade química. Como é que teriam surgido, então, na Terra formas quimicamente activas de fósforo? Uma fracção importante dos materiais meteoríticos e das poeiras interestelares que colidiram com a Terra no Hadeano continham minerais ricos em formas quimicamente mais reactivas de fósforo, como por exemplo o schreibersito, (Fe,Ni)3P, um mineral comum nos meteoritos de ferro.
Partindo deste pressuposto, Bryant e colegas simularam o impacto de um destes objectos numa fonte hidrotermal ácida, um sistema vulcânico certamente comum nos primórdios da formação do nosso planeta. Para realizarem esta experiência, os investigadores obtiveram amostras do meteorito de Sikhote-Alin, um meteorito de ferro rico em schreibersito que caiu na Sibéria em 1947, e expuseram-nas durante 4 dias aos fluídos geotermais ácidos de Hveradalur, na região vulcânica de Kverfjöll, na Islândia, seguidos de uma incubação de 30 dias no laboratório à temperatura ambiente. Análises realizadas à solução resultante revelaram a presença de pirofosfito [PPi(III)], uma molécula estrutural e funcionalmente semelhante ao pirofosfato [PPi(V)], a fracção do ATP responsável pela transferência de energia.
As moléculas pirofosfito (A) e pirofosfato (B).
Crédito: Sérgio Paulino (construídas com o software Avogrado).
Os autores deste trabalho sugerem que este composto poderá ter funcionado como uma forma pré-biótica plausível de moeda energética, usada nos processos químicos no interior das primeiras protocélulas. Ao contrário do ATP, a reactividade do pirofosfito não estaria limitada pela presença de sofisticados processos catalíticos.
David Bryant e os seus colegas da Universidade de Leeds, coautores deste estudo, estão neste momento a colaborar com uma equipa de investigadores americanos do Instituto de Tecnologia da Califórnia, para compreenderem como estas baterias químicas primitivas e os sistemas pré-bióticos onde estavam integradas, evoluíram para os primeiros sistemas biológicos complexos. Nesta nova fase deste trabalho, os investigadores vão não só usar nas experiências novos minerais e gases comuns nos primórdios da Terra, como também aplicar novos compostos químicos à superfície das amostras do meteorito e monitorizar as reacções químicas e os produtos resultantes. A equipa espera ainda repetir a experiência na ilha Disko, na Gronelândia, o único local da Terra onde é possível encontrar schreibersito.
Podem ler mais pormenores sobre este trabalho aqui.
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