Os mares do polo norte de Titã num mosaico construído com imagens obtidas pelo instrumento VIMS da sonda Cassini, na banda do infravermelho, a 21 de agosto de 2014.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/University of Arizona/University of Idaho.
Das centenas de luas conhecidas no Sistema Solar, Titã é a única com uma densa atmosfera e com vastos reservatórios de compostos líquidos na sua superfície. Estas características tornam-na de certa forma mais parecida com um planeta telúrico do que com as restantes luas geladas que circundam os gigantes gasosos do Sistema Solar exterior.
Tal como na Terra, a atmosfera de Titã é composta na sua grande maioria por azoto (mais de 95%, no caso da lua saturniana). Contudo, ao contrário do nosso planeta, Titã não possui praticamente nenhum oxigénio; o resto da sua atmosfera é constituída por metano e quantidades vestigiais de outros gases, incluindo o etano. Nas temperaturas frígidas de Titã, estes compostos podem ocorrer na superfície na sua forma líquida, pelo que os cientistas há décadas que especulavam sobre a possibilidade de existência de lagos e mares de hidrocarbonetos na lua saturniana.
Sabemos hoje que mais de 1,6 milhões de km2 da superfície de Titã (cerca de 2% do total) estão cobertos por mares e lagos de metano e etano líquidos, a maioria localizados nas proximidades do polo norte. A composição exata destes reservatórios manteve-se por determinar até 2014, altura em que Cassini usou, pela primeira vez, o seu radar para demonstrar que Ligieia Mare, o segundo maior mar de Titã, é rico em metano. Um novo estudo publicado na revista Journal of Geophysical Research: Planets vem agora confirmar de forma independente este resultado.
"Antes [dos resultados] da Cassini, esperávamos que Ligeia Mare fosse constituído principalmente por etano, um composto produzido em abundância na atmosfera, quando a luz solar quebra as moléculas de metano", disse Alice Le Gall, investigadora do centro LATMOS, em Paris, França, e primeira autora deste trabalho. "Em vez disso, este mar é composto predominantemente por metano."
Os autores ponderaram uma série de possíveis explicações para tão inesperados resultados. "Ou Ligeia Mare é reabastecido regularmente com chuva de metano, ou então alguma coisa está a remover o etano do seu interior", afirmou Le Gall. "É possível que o etano acabe por ir parar à crusta submarina, ou que flua, de alguma forma, para o mar adjacente, Kraken Mare, mas isso irá exigir uma investigação mais aprofundada."
Ligeia Mare num mosaico construído com imagens de radar obtidas pela Cassini entre fevereiro de 2006 e abril de 2007.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/ASI/Cornell.
Neste novo estudo, os investigadores combinaram várias observações radiométricas obtidas pelo radar da Cassini, entre 2007 e 2015, para detetarem as emissões térmicas provenientes de Ligeia Mare. Em paralelo, usaram ainda dados batimétricos recolhidos pelo mesmo instrumento em maio de 2013. Os resultados desta experiência foram publicados num artigo em 2014 e tinham já permitido aos cientistas confirmar a presença de profundidades máximas de 160 metros ao longo da área observada.
Com esta informação na mão, a equipa de Le Gall foi capaz de separar as contribuições feitas pela superfície do mar e pelo leito marinho para o total de emissões térmicas observadas. "Isto revelou que o leito de Ligeia Mare encontra-se coberto por uma camada de lodo rica em compostos orgânicos", acrescentou Le Gall.
Nas camadas superiores da atmosfera de Titã, as moléculas de azoto e metano sofrem a ação da radiação solar e das partículas energéticas da magnetosfera saturniana, fragmentando-se em iões precursores de uma variedade de compostos orgânicos, alguns dos quais com uma massa suficientemente grande para caírem diretamente sobre a superfície. Transportadas pela chuva e pelos rios, muitas destas moléculas acabam dissolvidas nos mares de metano. No entanto, moléculas insolúveis, como os nitrilos e o benzeno, afundam-se no leito marinho, formando uma camada de lodo compacta.
No estudo foram analisados ainda os perfis térmicos de Ligeia Mare, desde o final do inverno até à primavera. Os investigadores esperavam que os terrenos sólidos em redor aquecessem mais rapidamente que a superfície do mar, tal como acontece nas regiões costeiras da Terra. Surpreendentemente, os dados recolhidos pela Cassini mostram que não há diferenças significativas entre as temperaturas do mar e das zonas costeiras. Isto sugere que os terrenos em redor dos reservatórios de metano se encontram inundados com hidrocarbonetos líquidos, o que lhes confere propriedades térmicas semelhantes às da superfície dos mares.
"Este estudo desvendou, pela primeira vez, as propriedades básicas de um dos mares de Titã, melhorando a nossa compreensão dos processos climáticos e de circulação neste mundo fascinante", afirmou Nicolas Altobelli, investigador de projeto da equipa europeia da missão Cassini. O trabalho foi divulgado no passado mês de fevereiro no artigo Composition, seasonal change, and bathymetry of Ligeia Mare, Titan, derived from its microwave thermal emission por Alice Le Gall et al. (2016) e pode ser consultado aqui.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/University of Arizona/University of Idaho.
Das centenas de luas conhecidas no Sistema Solar, Titã é a única com uma densa atmosfera e com vastos reservatórios de compostos líquidos na sua superfície. Estas características tornam-na de certa forma mais parecida com um planeta telúrico do que com as restantes luas geladas que circundam os gigantes gasosos do Sistema Solar exterior.
Tal como na Terra, a atmosfera de Titã é composta na sua grande maioria por azoto (mais de 95%, no caso da lua saturniana). Contudo, ao contrário do nosso planeta, Titã não possui praticamente nenhum oxigénio; o resto da sua atmosfera é constituída por metano e quantidades vestigiais de outros gases, incluindo o etano. Nas temperaturas frígidas de Titã, estes compostos podem ocorrer na superfície na sua forma líquida, pelo que os cientistas há décadas que especulavam sobre a possibilidade de existência de lagos e mares de hidrocarbonetos na lua saturniana.
Sabemos hoje que mais de 1,6 milhões de km2 da superfície de Titã (cerca de 2% do total) estão cobertos por mares e lagos de metano e etano líquidos, a maioria localizados nas proximidades do polo norte. A composição exata destes reservatórios manteve-se por determinar até 2014, altura em que Cassini usou, pela primeira vez, o seu radar para demonstrar que Ligieia Mare, o segundo maior mar de Titã, é rico em metano. Um novo estudo publicado na revista Journal of Geophysical Research: Planets vem agora confirmar de forma independente este resultado.
"Antes [dos resultados] da Cassini, esperávamos que Ligeia Mare fosse constituído principalmente por etano, um composto produzido em abundância na atmosfera, quando a luz solar quebra as moléculas de metano", disse Alice Le Gall, investigadora do centro LATMOS, em Paris, França, e primeira autora deste trabalho. "Em vez disso, este mar é composto predominantemente por metano."
Os autores ponderaram uma série de possíveis explicações para tão inesperados resultados. "Ou Ligeia Mare é reabastecido regularmente com chuva de metano, ou então alguma coisa está a remover o etano do seu interior", afirmou Le Gall. "É possível que o etano acabe por ir parar à crusta submarina, ou que flua, de alguma forma, para o mar adjacente, Kraken Mare, mas isso irá exigir uma investigação mais aprofundada."
Ligeia Mare num mosaico construído com imagens de radar obtidas pela Cassini entre fevereiro de 2006 e abril de 2007.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/ASI/Cornell.
Neste novo estudo, os investigadores combinaram várias observações radiométricas obtidas pelo radar da Cassini, entre 2007 e 2015, para detetarem as emissões térmicas provenientes de Ligeia Mare. Em paralelo, usaram ainda dados batimétricos recolhidos pelo mesmo instrumento em maio de 2013. Os resultados desta experiência foram publicados num artigo em 2014 e tinham já permitido aos cientistas confirmar a presença de profundidades máximas de 160 metros ao longo da área observada.
Com esta informação na mão, a equipa de Le Gall foi capaz de separar as contribuições feitas pela superfície do mar e pelo leito marinho para o total de emissões térmicas observadas. "Isto revelou que o leito de Ligeia Mare encontra-se coberto por uma camada de lodo rica em compostos orgânicos", acrescentou Le Gall.
Nas camadas superiores da atmosfera de Titã, as moléculas de azoto e metano sofrem a ação da radiação solar e das partículas energéticas da magnetosfera saturniana, fragmentando-se em iões precursores de uma variedade de compostos orgânicos, alguns dos quais com uma massa suficientemente grande para caírem diretamente sobre a superfície. Transportadas pela chuva e pelos rios, muitas destas moléculas acabam dissolvidas nos mares de metano. No entanto, moléculas insolúveis, como os nitrilos e o benzeno, afundam-se no leito marinho, formando uma camada de lodo compacta.
No estudo foram analisados ainda os perfis térmicos de Ligeia Mare, desde o final do inverno até à primavera. Os investigadores esperavam que os terrenos sólidos em redor aquecessem mais rapidamente que a superfície do mar, tal como acontece nas regiões costeiras da Terra. Surpreendentemente, os dados recolhidos pela Cassini mostram que não há diferenças significativas entre as temperaturas do mar e das zonas costeiras. Isto sugere que os terrenos em redor dos reservatórios de metano se encontram inundados com hidrocarbonetos líquidos, o que lhes confere propriedades térmicas semelhantes às da superfície dos mares.
"Este estudo desvendou, pela primeira vez, as propriedades básicas de um dos mares de Titã, melhorando a nossa compreensão dos processos climáticos e de circulação neste mundo fascinante", afirmou Nicolas Altobelli, investigador de projeto da equipa europeia da missão Cassini. O trabalho foi divulgado no passado mês de fevereiro no artigo Composition, seasonal change, and bathymetry of Ligeia Mare, Titan, derived from its microwave thermal emission por Alice Le Gall et al. (2016) e pode ser consultado aqui.
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