sexta-feira, 1 de julho de 2016

Primeiras evidências diretas de que Marte teve no passado uma atmosfera rica em oxigénio

Windjana, local onde o robot Curiosity descobriu rochas contendo elevadas concentrações de óxido de manganésio.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/MSSS.

Rochas analisadas pelo robot Curiosity no interior da cratera Gale sugerem que Marte poderá ter tido no passado níveis significativamente mais elevados de oxigénio molecular (O2) na sua atmosfera. A descoberta foi divulgada esta semana num artigo publicado na revista Geophysical Research Letters e confirma o que outros resultados da missão tinham já revelado: Marte foi outrora um planeta muito mais semelhante à Terra.

Composta por aproximadamente 95% de dióxido de carbono (CO2), a atual atmosfera do planeta contém apenas quantidades vestigiais de O2. Estudos realizados em meteoritos provenientes da superfície de Marte sugerem, no entanto, que as concentrações atmosféricas de O2 eram significativamente mais elevadas logo após a formação do planeta. Este novo trabalho vem agora confirmar esta hipótese.

Usando dados obtidos pelo instrumento ChemCam do robot Curiosity, a equipa de investigadores identificou a presença de elevadas quantidades de óxido de manganésio (MnO) em veios formados em rochas sedimentares próximas de um antigo leito lacustre, na região de Kimberley, no interior da cratera Gale. "Na Terra, as únicas formas que sabemos serem necessárias para se formarem estes materiais contendo manganésio envolvem [a presença de] O2 atmosférico ou de microrganismos", afirmou Nina Lanza, investigadora do Laboratório Nacional de Los Alamos, nos Estados Unidos, e primeira autora deste trabalho. "Estamos agora a ver óxidos de manganésio em Marte, e estamos a pensar como diabo poderiam estes terem-se formado."

Microrganismos em Marte é ainda uma possibilidade muito remota, mas a outra alternativa - que a atmosfera marciana continha mais O2 no passado do que agora - parece plausível. "Esta quantidade elevada de materiais contendo manganésio não se forma sem grandes quantidades de água líquida e condições fortemente oxidantes", acrescentou Lanza. "Aqui na Terra tivemos grandes quantidades de água, mas sem a presença de quantidades significativas de depósitos de óxidos de manganésio, até depois dos níveis de O2 na atmosfera terem aumentado."

O aparecimento de minerais com uma elevada concentração de óxido de manganésio nos registos geológicos terrestres é um marcador importante de uma mudança profunda na composição da atmosfera do nosso planeta. Solúvel em água na sua forma reduzida, o manganésio forma precipitados quando encontra oxidantes fortes como o O2, pelo que o seu aparecimento em antigos sedimentos marinhos assinala o momento em que a Terra deixou de possuir uma atmosfera pobre em O2 e passou a ter níveis de O2 mais próximos dos atuais. A descoberta do mesmo tipo de materiais em Marte sugere que o O2 também atingiu concentrações relativamente elevadas na atmosfera do planeta vermelho, antes de diminuir até aos níveis vestigiais que hoje conhecemos. Se foi esse o caso, como se formou então esse antigo ambiente oxigenado?

"Uma das possíveis formas do O2 surgir na atmosfera marciana é através da quebra [de moléculas] de água, quando Marte estava a perder o seu campo magnético", disse Lanza. "Pensa-se que a água seria muito mais abundante nesse período da história de Marte."

Sem campo magnético para proteger o planeta do vento solar e das radiações cósmicas, as moléculas de água teriam sido divididas por fotólise em átomos de oxigénio e hidrogénio. Devido à sua baixa gravidade, o planeta viu-se incapaz de reter os átomos mais leves de hidrogénio, contudo o oxigénio, mais pesado, permaneceu na atmosfera. Uma parte reagiu com os minerais nas rochas, criando a abundância de óxidos de ferro que hoje podemos encontrar na poeira avermelhada que tinge a superfície do planeta. No entanto, o processo deve ter gerado uma concentração atmosférica de O2 significativamente mais elevada do que se pensava, uma vez que os óxidos de manganésio apenas se formam em ambientes fortemente oxidantes.

"É difícil confirmar se este cenário (...) ocorreu realmente", afirmou Lanza. "Contudo, é importante notar que esta ideia representa uma mudança na nossa compreensão de como as atmosferas planetárias poderão ficar oxigenadas." A abundância de O2 nas atmosferas planetárias tem sido vista como um potencial marcador para a deteção de vida noutros planetas. Esta descoberta sugere, no entanto, que os planetas podem gerar níveis relativamente elevados de O2 recorrendo apenas a processos abióticos.

Podem encontrar todos os detalhes deste trabalho aqui.

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