quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Hubble fotografa um olho gigante na face de Júpiter

Júpiter visto pelo telescópio espacial Hubble, a 21 de abril de 2014.
Crédito: NASA/ESA/A. Simon (Goddard Space Flight Center).

No passado mês de abril, o telescópio espacial Hubble fotografou o que parece ser um gigantesco olho na face turbulenta de Júpiter. Na altura, o Hubble estava a monitorizar mudanças na dinâmica interna da Grande Mancha Vermelha (GMV), quando a sombra da lua Ganimedes atravessou o centro da imensa tempestade. Por momentos, o alinhamento fortuito deu ao planeta a aparência de um gigante ciclope encarando os seus observadores na Terra.

A GMV foi descoberta em 1665, pelo astrónomo Giovanni Domenico Cassini. Observações recentes sugerem que a tempestade tem vindo a diminuir significativamente de tamanho nos últimos anos, atingindo no início deste ano um diâmetro inferior a 16,5 mil quilómetros.

domingo, 26 de outubro de 2014

Terra tem água mais antiga que o Sol

Ilustração da viagem da água, desde a nuvem molecular progenitora do Sol até à sua incorporação nos planetas.
Crédito: Bill Saxton/NSF/AUI/NRAO.

A água foi crucial no desenvolvimento da vida na Terra, pelo que a identificação da sua origem poderá ajudar a estimar a probabilidade da existência de vida noutros planetas. Uma equipa de investigadores abordou esta questão num estudo recentemente publicado na revista Science, e concluiu que uma parte importante da água no Sistema Solar poderá ter vindo de pequenos fragmentos de gelo de água formados no espaço interestelar. Esta descoberta sugere que a água é um ingrediente amplamente disponível para a formação de planetas, o que tem profundas implicações na abundância de sistemas planetários com planetas potencialmente habitáveis.

A água está em toda a parte no Sistema Solar. Podemos encontrá-la não só nos oceanos da Terra, mas também no interior de crateras permanentemente sombrias nas regiões polares de Mercúrio, no regolito da superfície da Lua, nas calotes polares de Marte, nas luas geladas dos gigantes gasosos, nos gelos dos cometas, ou nas rochas dos asteroides carbonáceos. Sendo os objetos mais primitivos do Sistema Solar, os cometas e os asteroides são particularmente interessantes porque retêm os traços gerais das condições presentes nos primórdios da formação dos planetas. Contudo, apesar de fornecerem informações inestimáveis acerca da distribuição de compostos voláteis logo após o nascimento do Sol, a origem da água nestes objetos permaneceu até hoje um mistério.

No início da formação do Sistema Solar, o Sol encontrava-se rodeado por um disco protoplanetário, a partir do qual viriam a emergir a Terra e os outros planetas. No entanto, até agora, os cientistas não sabiam se as partículas de gelo, que nesta altura vagueavam em redor do Sol, seriam as mesmas da nuvem molecular progenitora da nossa estrela, ou se esta água interestelar teria sido destruída e recriada por reações químicas no interior do disco protoplanetário.

"Porque é que isto é importante? Se nos primórdios do Sistema Solar, a água foi principalmente herdada do gelo proveniente do espaço interestelar, então é provável que gelos semelhantes, junto com a matéria orgânica prebiótica que contêm, sejam abundantes na maioria ou em todos os discos protoplanetários, em redor de estrelas em formação", explicou Conel Alexander, investigador do Instituto Carnegie de Washington, nos Estados Unidos, e coautor deste trabalho. "Mas se a água presente nos primórdios do Sistema Solar foi, em grande parte, resultante de processamento químico local, durante o nascimento do Sol, então é possível que a abundância de água nos sistemas planetários em formação varie consideravelmente, o que obviamente teria implicações no potencial para o aparecimento de vida noutros locais."

O planeta azul visto pela sonda MESSENGER, a 02 de agosto de 2005.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington/Gordan Ugarkovic.

Para determinarem o cenário mais provável, os investigadores focaram-se no hidrogénio e no seu isótopo mais pesado, o deutério. Os isótopos são átomos do mesmo elemento, mas com um número diferente de neutrões. A diferença de massa influencia de forma subtil o comportamento dos diferentes isótopos nas reações químicas, pelo que a razão de deutério/hidrogénio (D/H) nas moléculas de água varia de acordo com as condições em que estas são criadas.

Como no espaço interestelar a água é formada a temperaturas muito baixas e sob intensa radiação cósmica, as moléculas de água interestelares tendem a ter uma razão D/H cerca de seis vezes superior às encontradas na Terra e noutros corpos do Sistema Solar. Para esclarecerem a origem do deutério no Sistema Solar, os investigadores criaram modelos que simulam um disco protoplanetário desprovido de deutério. Partindo desta condição inicial, a equipa testou a formação de água com deutério, também conhecida por água pesada, durante um período de um milhão de anos. O objetivo deste exercício foi verificar se o sistema poderia atingir as razões D/H observadas em amostras de meteoritos, nos oceanos terrestres, e nos cometas.

"Deixámos a química evoluir ao longo de um milhão de anos - o tempo de vida típico de um disco protoplanetário - e descobrimos que os processos químicos no disco eram ineficientes na formação de água pesada por todo o Sistema Solar", afirmou Ilsedore Cleeves, investigadora da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e primeira autora do trabalho. "O que isto implica é que, se o disco planetário não produziu a água, então herdou-a. Consequentemente, uma fração da água no nosso Sistema Solar é mais antiga que o Sol."

Cleeves e colegas estimaram que 7 a 50% da água presente nos nossos oceanos terá tido origem no meio interestelar! "Estes resultados têm implicações bastante emocionantes", acrescenta Cleeves. "Se a formação da água fosse um processo local (...), a quantidade de água e de outros ingredientes químicos importantes, necessários para a formação da vida, poderia variar de sistema para sistema. No entanto, porque alguns dos gelos quimicamente ricos da nuvem molecular são diretamente herdados, os jovens sistemas planetários têm assim acesso a estes importantes ingredientes."

Podem encontrar todos os pormenores deste trabalho aqui.

sábado, 25 de outubro de 2014

Ambição


Foi hoje oficialmente apresentado o filme Ambition, uma curta película de promoção da missão europeia Rosetta. Rodado numa paisagem desolada, na Islândia, Ambition mostra um mestre e a sua jovem aprendiz criando modelos de planetas, luas, asteroides e cometas a partir de terra e cascalho.

Enquanto manipula a sua pequena versão do Sistema Solar, o mestre disserta sobre a insistente procura do ser humano pela origem da água, o ingrediente essencial para a vida na Terra.

"Com o tempo, voltámo-nos para os cometas", explica. "Um bilião de bolas celestes de poeira, gelo, moléculas complexas, que sobraram do nascimento do nosso Sistema Solar. Outrora considerados como mensageiros da desgraça e destruição, e no entanto, tão encantadores... E fomos apanhar um: um plano incrivelmente ambicioso."



Ambition é um projeto que nasceu de uma colaboração entre a ESA e a Platige Image. Dirigido pelo polaco Tomasz Bagiński, o filme conta com a participação do ator irlandês Aiden Gillen, conhecido pela sua aparição na série Game of Thrones, no papel de Lord Petyr Baelish.

Ambition invoca a missão Rosetta como símbolo da conquista do impossível. Após décadas de planeamento, construção e jornada pelos limites do Sistema Solar interior, a pequena sonda europeia alcançou, finalmente, em Agosto passado, o seu objetivo máximo: orbitar o núcleo do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko.

Cumprido que está este desafio, a Rosetta prepara-se agora para um novo objetivo, ainda mais ambicioso: colocar a pequena sonda Philae na superfície do cometa. Agendada para 12 de novembro, a manobra tornar-se-á um marco histórico na exploração espacial - a primeira abordagem de um veículo espacial a um dos mais misteriosos objetos do Sistema Solar.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Siding Spring visto pela Mars Reconnaissance Orbiter

Imagens de alta-resolução do cometa Siding Spring, obtidas pela sonda Mars Reconnaissance Orbiter, no dia 19 de outubro de 2014.
Crédito: NASA/JPL/University of Arizona.

A NASA divulgou ontem imagens do cometa C/2013 A1 (Siding Spring), obtidas no passado domingo pela câmara HiRISE da sonda Mars Reconnaissance Orbiter (MRO). Captadas a uma distância mínima de 138 mil quilómetros, as imagens mostram o núcleo e a parte mais brilhante da cabeleira do cometa, com uma resolução de aproximadamente 138 metros por pixel.

Antes da sua passagem por Marte, os astrónomos estimavam que o núcleo de Siding Spring teria cerca de 1 quilómetro de diâmetro. As novas imagens da HiRISE mostram, no entanto, uma região central mais brilhante com apenas 2 a 3 pixels de diâmetro, o que sugere a presença de um corpo sólido com um diâmetro inferior a 500 metros.

Estas observações só foram possíveis devido ao trabalho meticuloso dos engenheiros da Lockheed-Martin. Para se certificarem de que iriam saber com exatidão a posição de Siding Spring, a equipa usou a câmara HiRISE para detetar o cometa 12 dias antes do evento. Para sua surpresa, Siding Spring não se encontrava exatamente na direção prevista.

Os novos dados permitiram aos engenheiros do Laboratório de Propulsão a Jato recalcularem a trajetória do cometa, o que por sua vez possibilitou uma correta reorientação da MRO durante a fase de maior aproximação. Sem esta atualização, o cometa poderia nunca ter ficado no campo de visão da HiRISE.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Opportunity fotografa o cometa Siding Spring

Cometa Siding Spring visto pelo robot Opportunity, a 19 de outubro de 2014.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/Cornell Univ./ASU/TAMU.

Foram divulgadas há pouco as primeiras imagens do cometa C/2013 A1 (Siding Spring), obtidas a partir da superfície de Marte. Captadas pelo robot Opportunity, as imagens mostram o cometa cerca de duas horas e meia antes de alcançar o ponto de maior aproximação ao planeta. Na altura, os céus sobre a cratera Endeavour estavam ainda suficientemente escuros para que a cabeleira difusa de Siding Spring se destacasse com relativa facilidade na direção da constelação da Baleia, entre as estrelas α Ceti (Menkar) e ο Ceti (Mira).

sábado, 18 de outubro de 2014

Encontro com um cometa

Representação artística do encontro do cometa Siding Spring com o planeta Marte, a 19 de outubro de 2014.
Crédito: NASA.

Será já amanhã que o cometa C/2013 A1 (Siding Spring) passará a uma curta distância do planeta Marte. O núcleo do cometa tem cerca de 700 metros de diâmetro e deverá alcançar uma distância mínima de 137 mil quilómetros da superfície marciana, pelas 19:29 (hora de Lisboa). Marte passará através da parte mais densa da cabeleira cerca de 100 minutos depois, pelo que a frota de sondas da NASA, ESA e ISRO estará na altura abrigada no lado oposto do planeta para evitar possíveis colisões com partículas do cometa. Ainda assim, estão planeadas sessões especiais de observação do evento para as cinco sondas na órbita de Marte e para os dois robots na superfície do planeta.

O encontro poderá ser acompanhado em direto via livestream, desde o Centro de Operações Espaciais da ESA, em Darmstadt, na Alemanha, a partir das 18:50 (hora de Lisboa). Vejam em baixo:


Atualização: Devido a problemas técnicos, a transmissão em direto do Centro de Operações Espaciais da ESA foi substituída por um Google hangout. Vejam em baixo:


Um oceano em Mimas?

A lua Mimas, com a sua proeminente cratera Herschel, num mosaico criado com imagens obtidas pela sonda Cassini, a 13 de fevereiro de 2010.
Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute.

Esconderá Mimas um oceano no seu interior? De acordo com um novo estudo publicado esta semana na revista Science, esta é uma fascinante possibilidade. Partindo de uma análise detalhada de imagens obtidas pela sonda Cassini, os autores descobriram que a amplitude da libração longitudinal de Mimas é superior ao que seria de esperar para um corpo em equilíbrio hidrostático. O fenómeno sugere dois cenários intrigantes: ou a pequena lua tem um oceano no seu interior, ou o seu núcleo tem uma forma semelhante à de uma bola de râguebi.

"Os dados sugerem que algo não está bem, por assim dizer, no interior de Mimas", afirmou Radwan Tajeddine, investigador da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, e primeiro autor deste trabalho. "A quantidade de oscilação que medimos é duas vezes superior ao previsto."

Tal como muitas outras luas no Sistema Solar (incluindo a nossa), Mimas tem sempre a mesma face voltada para Saturno - um efeito resultante de uma sincronização entre a sua rotação e a sua órbita em redor do planeta. Esta coincidência resulta de uma ressonância rotação-translação 1:1, provocada pela influência gravitacional de Saturno. A órbita de Mimas é, no entanto, significativamente excêntrica, o que produz uma ligeira oscilação longitudinal ao longo de cada revolução - um fenómeno a que os cientistas chamam de libração longitudinal.

"O estudo das librações pode fornecer informações úteis acerca do que se passa no interior de um objeto", disse Tajeddine. "Neste caso, está a dizer-nos que esta pequena lua crivada de crateras poderá ser mais complexa do que pensávamos."

Para medirem as amplitudes de libração longitudinal de Mimas, os investigadores construíram um modelo tridimensional da pequena lua, a partir de imagens de alta-resolução obtidas pela sonda Cassini. Após analisarem o movimento de centenas de pontos de referência na sua superfície, Tajeddine e colegas descobriram que estes oscilam numa amplitude máxima de 6 quilómetros, cerca do dobro do previsto, tendo em conta o diâmetro de Mimas e a excentricidade da sua órbita.

Mimas em frente de Saturno, numa imagem obtida pela sonda Cassini, a 26 de novembro de 2008.
Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute.

Após testarem vários modelos do interior da pequena lua, os investigadores reduziram as hipóteses apenas a dois cenários possíveis: uma estrutura composta por um núcleo rochoso muito alongado rodeado por uma camada de gelo esférica, ou um oceano subsuperficial isolado por uma espessa camada de gelo.

Se se confirmar o primeiro cenário, esta poderá ser uma pista fundamental para a evolução de Mimas desde a sua formação, há mais de 4 mil milhões de anos. De acordo com os investigadores, o núcleo poderia ter adquirido a sua forma invulgar, se se tivesse formado numa região muito mais próxima de Saturno, onde as forças de maré são mais intensas. A pequena lua poderia, depois, ter migrado para uma órbita mais exterior, acumulando na sua superfície camadas sucessivas de gelo, que por serem mais deformáveis, adquiririam uma forma mais esférica. No entanto, seria de esperar a presença de vestígios desse núcleo fóssil emergindo na superfície de Mimas, algo que os investigadores não encontraram.

O cenário alternativo é a presença de um oceano de água líquida, cerca de 24 a 31 quilómetros abaixo da superfície envelhecida da pequena lua. Com cerca de 396 quilómetros de diâmetro, Mimas é demasiado pequena para conservar o calor interno gerado ao longo da sua história pelos elementos radioativos acumulados durante a sua formação, pelo que terá sido necessária outra fonte de energia para manter um oceano subsuperficial. Os investigadores sugerem que a sua órbita poderá ter sido mais excêntrica no passado, o que poderia ter assegurado calor de maré suficiente para derreter o gelo no seu interior.

Caso se confirme esta possibilidade, Mimas juntar-se-á ao clube de objetos no Sistema Solar, cujos interiores poderão albergar oceanos de água líquida, um grupo onde estão incluídas as luas jovianas Europa, Ganimedes e Calisto, os satélites de Saturno Encélado e Titã, e a companheira de Plutão, a lua Caronte. A Cassini irá sobrevoar a superfície de Mimas, a 13 de janeiro de 2016, a uma distância de 28 mil quilómetros. Este será o mais próximo de um conjunto de encontros agendados para 2016 e 2017 - uma mão cheia de oportunidades para os cientistas poderem recolher mais dados que possam ajudar a esclarecer esta questão.

Podem encontrar mais pormenores acerca deste trabalho aqui.

MESSENGER fotografa depósitos de gelo na região do polo norte de Mercúrio

Cratera Prokofiev, uma das crateras do polo norte de Mercúrio com depósitos de materiais voláteis no seu interior. Imagem obtida pela sonda MESSENGER, a 07 de janeiro de 2013.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington.

Foram divulgadas esta semana as primeiras imagens dos depósitos de gelo de água e de outros materiais voláteis, que se escondem no interior de crateras permanentemente sombrias, na região do polo norte de Mercúrio. Obtidas pela sonda MESSENGER, as novas imagens revelam, pela primeira vez, a morfologia destas estruturas, e providenciam pistas importantes para a determinação da sua idade e dos mecanismos envolvidos na sua formação. Os resultados destas observações foram apresentados num artigo publicado na passada quinta-feira, na revista Geology.

Imagens de radar obtidas no início dos anos 90, pelo observatório de Goldstone, nos Estados Unidos, revelaram um conjunto de superfícies com elevada refletividade na região do polo norte de Mercúrio, que sugeriam a presença de depósitos de gelo de água no interior das mais profundas crateras polares. Esta hipótese foi recentemente confirmada pela sonda MESSENGER, através da combinação de dados de espetroscopia de neutrões, de refletometria de infravermelhos e de modelos da distribuição das temperaturas na superfície do planeta. "Mas com a confirmação da ideia inicial, há muito de novo para ser esclarecido através da observação destes depósitos", afirmou Nancy Chabot, investigadora responsável pelo sistema de imagem da sonda MESSENGER e primeira autora deste trabalho.

Cumpridos os objetivos da missão primária da sonda MESSENGER, os responsáveis pela missão lançaram, no início de 2012, uma campanha de observação do interior das crateras da região do polo norte de Mercúrio. Embora os depósitos polares estejam escondidos em áreas permanentemente sombrias, técnicas elaboradas de processamento de imagem permitiram aos cientistas obter, pela primeira vez, imagens da superfície destas estruturas, usando apenas a fraca iluminação providenciada pela luz refletida pelas paredes iluminadas das crateras.

As áreas permanentemente sombrias da cratera Prokofiev, numa imagem obtida pela sonda MESSENGER, a 18 de agosto de 2013. Encontram-se delineadas a amarelo as áreas que albergam superfícies com elevada refletividade radar.
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington.

A equipa concentrou-se, em particular, na cratera Prokofiev, a maior cratera da região do polo norte de Mercúrio onde foram identificados depósitos de materiais voláteis. "As imagens revelaram extensas regiões com distintivas propriedades refletivas", disse Chabot. "Um dos locais interpretados como possuindo amplos depósitos de gelo de água, exibe uma textura marcada por crateras, o que indica que o gelo foi depositado mais recentemente que qualquer uma das crateras que se encontram por baixo."

Noutros locais, o gelo de água também se encontra presente, "mas está coberto por uma fina camada de materiais negros, que provavelmente consistem em depósitos ricos em compostos orgânicos congelados", explica Chabot. Estes depósitos exibem fronteiras bem definidas, uma característica que surpreendeu os investigadores porque "indicam que os depósitos voláteis observados nos polos de Mercúrio são geologicamente recentes."

"Uma das questões fundamentais com que nos debatemos é: quando é que surgiram os depósitos de gelo de água de Mercúrio? Terão milhares de milhões de anos, ou foram depositados apenas recentemente?", disse Chabot. "Sabermos o quão antigos são estes depósitos tem implicações na compreensão dos mecanismos que levaram a água a todos os planetas telúricos, incluindo a Terra."

No geral, as imagens indicam que os materiais voláteis foram depositados recentemente, ou são regularmente renovados no interior das crateras polares por processos ainda desconhecidos. As imagens revelam, ainda, uma clara distinção entre a Lua e Mercúrio, que poderá ser importante na determinação da idade dos depósitos. "As regiões polares de Mercúrio têm extensas áreas cobertas por gelo de água; porém, as regiões polares da Lua (que também possuem regiões permanentemente sombrias, e que, na verdade, são mais frias) têm uma morfologia diferente", explica Chabot.

Uma explicação para esta discrepância poderá ser a de que os depósitos de Mercúrio são mais recentes. Se for este o caso, então os objetos do Sistema Solar interior deverão ter recebido uma quantidade substancial de materiais voláteis ao longo de toda a sua história. "Esta é uma questão fundamental", afirmou Chabot. "Se pudermos compreender porque é que um corpo tem determinado aspeto, e o outro parece diferente, entenderemos melhor qual o processo subjacente, o que, por sua vez, nos levará à idade e distribuição do gelo de água no Sistema Solar. Esta será uma linha de investigação muito interessante a desenvolver no futuro."

Podem encontrar mais detalhes acerca deste trabalho aqui.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Lua teve erupções vulcânicas num passado muito recente

Depósitos vulcânicos recentes nas proximidades da cratera Maskelyne. Imagem obtida pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter.
Crédito: NASA/GSFC/Arizona State University.

Foi há mais de 3 mil milhões de anos que violentas erupções vulcânicas criaram as vastas planícies basálticas, facilmente reconhecíveis a olho nu no lado da Lua mais próximo da Terra. Dados estratigráficos sugerem, no entanto, que este período de intenso vulcanismo lunar ter-se-á prolongado por mais algumas centenas de milhões de anos, antes de cessar abruptamente há cerca de mil milhões de anos.

Investigadores da Universidade do Estado do Arizona, nos Estados Unidos, e do Instituto de Planetologia da Universidade de Münster, na Alemanha, vêm agora revelar novas evidências da presença de focos de atividade vulcânica ainda mais recentes na superfície da Lua. A descoberta foi divulgada num artigo publicado esta semana na revista Nature Geoscience.

Usando imagens obtidas pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter, a equipa liderada pela investigadora norte-americana Sarah Braden identificou cerca de 70 formações vulcânicas recentes, espalhadas pelas planícies basálticas, ou maria, que se estendem pelo interior das gigantescas bacias de impacto do lado da Lua mais próximo da Terra. Estas estruturas exibem uma distinta morfologia, caracterizada pela presença de pequenas colinas arredondadas de textura uniforme, interrompidas por porções irregulares de terreno rugoso.

Localização das estruturas identificadas neste trabalho no lado da Lua mais próximo da Terra. Legenda: Aristarchus (A), região Gruithuisen E-M (GEM), Hyginus (H), Ina (I), Mare Nubium (MN), Mare Tranquillitatis (MT), Marius Hills (MH), Maskelyne (M), Sosigenes (S).
Crédito: NASA/GSFC/Arizona State University.

Com comprimentos que vão desde os 100 aos 5000 metros, estas formações são demasiado pequenas para serem vistas a partir da Terra. Uma das maiores, uma área bem estudada conhecida por Ina, foi fotografada pela primeira vez em 1971, quando os astronautas da missão Apollo 15 sobrevoaram a região de Lacus Felicitatis. Desde essa altura, Ina tem sido interpretada como uma jovem caldeira vulcânica, formada no topo de um pequeno vulcão-escudo.

As imagens em alta-resolução obtidas nos últimos 5 anos pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter permitiram aos investigadores reconhecer muitas outras estruturas com morfologias e texturas semelhantes. O seu elevado número e ampla distribuição sugerem que os mais recentes surtos de vulcanismo lunar não foram uma anomalia, mas sim uma parte importante da evolução geológica da Lua.

Perspetiva sobre Ina, uma depressão semicircular com 2,98 quilómetros de diâmetro, localizada em Lacus Felicitatis, a norte de Mare Vaporum. Imagem obtida pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter.
Crédito: NASA/GSFC/Arizona State University.

A ausência generalizada de crateras de impacto com mais de 20 metros de diâmetro no interior destas áreas sugere que estas estruturas foram criadas nos últimos 100 milhões de anos. No caso de Ina, os investigadores descobriram que a atividade vulcânica poderá ter cessado apenas há cerca de 33 milhões de anos. Outra estrutura, conhecida por Sosigene, poderá ter-se mantido ativa até há pelo menos 18 milhões de anos!

Esta nova descoberta tem fortes implicações na forma como os cientistas encaram a evolução e distribuição de calor no interior da Lua. "A presença e juventude destas áreas irregulares fornece uma nova limitação aos modelos de evolução térmica do interior da Lua", afirmou Sarah Braden, primeira autora deste trabalho. "O manto lunar teve de permanecer quente o suficiente, pelo tempo necessário, para providenciar magma a estas pequenas erupções."

Curiosamente, os resultados deste novo trabalho são consistentes com as leituras térmicas do regolito lunar, obtidas nos locais de alunagem das missões Apollo 15 e 17. As temperaturas medidas pelos astronautas norte-americanos eram ligeiramente mais elevadas que as previstas pelos modelos, pelo que, na altura, os cientistas propuseram que a discrepância seria devido a defeitos nos instrumentos ou a anomalias pontuais no fluxo térmico nos dois locais de alunagem.

"Estas jovens estruturas vulcânicas são, agora, alvos primordiais para futura exploração, tanto robótica como humana", sugeriu Mark Robinson, um dos coautores deste trabalho. A recolha de amostras nestes locais forneceria certamente pistas cruciais para a compreensão da Lua como um todo, desde a sua evolução geológica até à sua estrutura interna.

Podem ler mais sobre este trabalho aqui.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Água no solo lunar criada pelo vento solar

Eugene Cernan colhendo amostras de solo lunar no vale de Taurus-Littrow, local de alunagem da missão Apollo 17. Imagem obtida pelo astronauta Harrison Schmitt, a 11 de Dezembro de 1972.
Crédito: NASA.

Quase toda a água no solo lunar tem origem no vento solar, revela um novo estudo publicado na semana passada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences. Baseados na análise de amostras de solo lunar, Alice Stephant e François Robert, do Instituto de Mineralogia, Física de Materiais e Cosmoquímica, em França, sugerem que a vasta maioria da água presente na superfície da Lua foi depositada, não pelos impactos de asteroides e cometas, mas por colisões entre partículas do vento solar e os átomos de oxigénio do regolito lunar.

Em 2010, análises às amostras recolhidas pelas missões Apollo demonstraram a presença de quantidades vestigiais de água na superfície e no interior da Lua. Estes resultados confirmam as deteções remotas de moléculas de água e de hidróxilo na superfície lunar, realizadas em 2009 pela sonda indiana Chandrayaan-1, e contrariam a hipótese anteriormente prevalecente de que a Lua teria perdido há muito todos os seus compostos voláteis.

Após esta descoberta, muitos cientistas assumiram que a água teria chegado à Lua, através dos incessantes impactos, que desde a sua formação crivaram a superfície lunar de crateras. Para testarem esta hipótese, Stephant e Robert mediram as razões isotópicas de hidrogénio (D/H) e de lítio (7Li/6Li) em amostras de solo lunar recolhidas pelos astronautas das missões Apollo 16 e 17. Em cada amostra, os investigadores analisaram grãos de poeira provenientes de profundidades até aos 2,8 metros, com o objetivo de determinarem a abundância relativa dos diferentes isótopos nas diferentes camadas superficiais.

Como o hidrogénio pesado, também conhecido por deutério (D), é mais abundante nas regiões mais distantes do Sol, as potenciais fontes de água no Sistema Solar tendem a ter diferentes razões isotópicas de hidrogénio. Cometas e asteroides apresentam proporções distintivas, muito diferentes das encontradas no vento solar e na radiação cósmica, pelo que os dois investigadores puderam identificar com precisão a origem das moléculas de água detetadas nos diferentes grãos de poeira lunar.

Stephant e Robert descobriram que a maioria da água presente no solo lunar tem origem na redução do oxigénio dos silicatos dos grãos de poeira pelos protões do vento solar. Esta conclusão é suportada pelas diferentes razões 6Li/D detetadas nas amostras, que indicam que menos de 15% da água do solo lunar tem uma proveniência distinta (presumivelmente, em cometas e asteroides).

Podem ler mais pormenores acerca deste trabalho aqui.

domingo, 12 de outubro de 2014

Eclipse lunar visto pela MESSENGER

O eclipse da Lua de 8 de outubro de 2014 visto da órbita de Mercúrio pela sonda MESSENGER. A animação inclui 31 imagens obtidas entre as 10:18 e as 11:18 (hora de Lisboa).
Crédito: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington.

No passado dia 8 de outubro, a sonda MESSENGER apontou as suas câmaras na direção da Terra para observar o mais recente eclipse da Lua. Na altura, a sonda da NASA encontrava-se a cerca de 107 milhões de quilómetros de distância.

Durante o eclipse, a Lua parece desaparecer gradualmente, à medida que se embrenha na sombra da Terra. Os dois objetos surgem no campo de visão da câmara de ângulo fechado da MESSENGER como dois pontos muito brilhantes com 1 e 5 pixels de diâmetro, respetivamente, separados por apenas 40 pixels. As imagens foram ampliadas 2 vezes, e o brilho da Lua foi aumentado 25 vezes para mostrar com maior clareza o seu desaparecimento.

sábado, 11 de outubro de 2014

Lado oculto de Lutécia esconde uma grande cratera

A cratera Massilia (a vermelho) e uma das crateras do aglomerado do polo norte de Lutécia (a roxo), numa imagem obtida pela sonda Rosetta, a 10 de julho de 2010. Estão evidenciados diversos sulcos associados a estas duas estruturas de impacto (cores respetivas). Os sulcos azuis estão associados a uma estrutura desconhecida localizada no hemisfério sul de Lutécia. A amarelo estão assinalados outros sulcos.
Crédito: ESA/Rosetta/MPS para a equipa OSIRIS/UPD/LAM/IAA/SSO/INTA/UPM/DASP/IDA.

Cientistas descobriram evidências da presença de uma grande cratera no lado oculto de (21) Lutécia, um dos maiores objetos da Cintura de Asteroides. Usando imagens obtidas pela sonda Rosetta, a equipa liderada por Sebastien Besse, do Centro Europeu de Investigação e Tecnologia Espaciais (ESTEC) da ESA, na Holanda, analisou a distribuição e orientação de cerca de duas centenas de sulcos na superfície do asteroide. Os resultados foram divulgados num artigo que será publicado na próxima semana na revista Planetary and Space Science, e sugerem que estas formações tiveram origem em três impactos - um deles ocorrido no hemisfério sul de Lutécia, numa região não observada pela sonda europeia durante o seu breve encontro com o asteroide, a 10 de julho de 2010.

Os sulcos são estruturas lineares encontradas numa parte significativa dos asteroides visitados por sondas espaciais. Fotografadas pela primeira vez na superfície da lua Fobos, estas formações foram posteriormente identificadas nos asteroides (243) Ida, (951) Gaspra, (433) Eros e (4) Vesta. Os mecanismos envolvidos na sua formação são, ainda, alvo de intenso debate; no entanto, estão aparentemente relacionados com as ondas de choque geradas por violentos impactos no interior destes objetos.

"Assumindo que os sulcos foram formados em padrões concêntricos em redor de uma cratera de impacto de origem, identificámos, no caso de Lutécia, duzentas destas estruturas organizadas em famílias distintas, que se correlacionam com três crateras de impacto diferentes", explicou Besse, primeiro autor deste trabalho. Duas destas famílias parecem estar associadas, respetivamente, a duas estruturas localizadas no hemisfério norte de Lutécia: a cratera Massilia e o aglomerado de crateras do polo norte, um grupo que inclui diversas crateras sobrepostas. O terceiro sistema converge para um local no lado oculto do asteroide, uma cratera putativa, à qual os investigadores deram o nome de Suspicio.

Modelo tridimensional de Lutécia com a localização de Suspicio no hemisfério sul. A cratera deverá ter entre 15 a 45 quilómetros de diâmetro.
Crédito: ESA/Rosetta/MPS para a equipa OSIRIS/UPD/LAM/IAA/SSO/INTA/UPM/DASP/IDA.

Os sulcos associados a Suspicio cobrem uma área significativa da superfície do asteroide, o que sugere que a cratera tem provavelmente algumas dezenas de quilómetros de diâmetro. Em comparação, Massilia tem cerca de 55 quilómetros de diâmetro, enquanto que a maior cratera do aglomerado do polo norte tem aproximadamente 34 quilómetros de diâmetro. "Estes três grandes impactos deformaram de forma significativa a superfície de Lutécia", afirmou Besse.

A partir da análise da densidade de pequenas crateras formadas sobre os sulcos, os investigadores puderam calcular a idade relativa dos três impactos. Aparentemente, Massilia é a mais antiga das três crateras, seguida de Suspicio e do aglomerado de crateras do polo norte.

Modelos tridimensionais de Lutécia gerados a partir de dados obtidos pelos observatórios espaciais Herschel e Spitzer tinham já previsto a presença de uma grande depressão no local onde agora foi identificada a cratera Suspicio. Observações realizadas pelo telescópio de infravermelhos IRTF, no Hawaii, sugerem a existência de diferenças significativas na composição da superfície, entre o hemisfério norte e o hemisfério sul do asteroide. Besse e colegas propõem que tais diferenças possam ter origem em materiais escavados do interior de Lutécia pelo impacto que criou Suspicio.

"O nosso estudo liga diversas análises independentes numa única história coerente, que é consistente com a presença de uma grande cratera de impacto no lado oposto [ao das observações] do asteroide", concluiu Michael Küppers, investigador do Centro de Astronomia Espacial da ESA, em Espanha, e coautor deste trabalho.

Podem encontrar mais detalhes aqui.

domingo, 5 de outubro de 2014

Glaciares em Valles Marineris?

Perspectiva sobre a região central de Valles Marineris, construída com imagens obtidas pela sonda Mars Express, a 24 de Abril e a 2 de Maio de 2004.
Crédito: ESA/DLR/FU Berlin (G. Neukum).

Desde há algumas décadas que os cientistas suspeitam que vastos glaciares possam ter deslizado no passado pelos profundos vales de Valles Marineris, uma gigantesca cicatriz tectónica que se estende ao longo do equador marciano, a leste da região de Tharsis. Imagens obtidas a partir da órbita marciana permitiram a identificação de diferentes formações geológicas, aparentemente, esculpidas no seu interior pelo fluxo de grandes massas de gelo; contudo, tais interpretações permaneceram até hoje altamente controversas. Um novo trabalho recentemente publicado na revista Geology vem agora revelar o que poderá ser a primeira evidência mineralógica da presença de antigos glaciares no interior do gigantesco sistema de canhões.

Usando dados espetrais obtidos pelo instrumento CRISM e imagens obtidas pela câmara HiRISE da sonda Mars Reconnaissance Orbiter, uma equipa de investigadores liderada por Selby Cull do Departamento de Geologia do Bryn Mawr College identificou um conjunto de depósitos de jarosite nas paredes meridionais de Ius Chasma, no extremo ocidental de Valles Marineris. A jarosite (KFe3(SO4)2(OH)6) é um mineral secundário geralmente formado em ambientes acídicos, pela oxidação de compostos sulfídricos, ou pela exposição de rochas vulcânicas a fluídos ricos em sulfatos.

Em Marte, os cientistas tinham já detetado este mineral em evaporitos precipitados pela evaporação de massas de água superficiais, ou a partir de lençóis freáticos. Localizados a meio caminho do topo de Ius Chasma, os depósitos agora descobertos apresentam uma morfologia e um contexto geológico difíceis de explicar pelos mesmos mecanismos. Em vez disso, Cull e colegas sugerem que o calor proveniente das paredes do canhão terá fundido parcialmente o gelo dos glaciares, formando bolsas de água líquida que, por sua vez, terão reagido com compostos de enxofre presentes na antiga atmosfera do planeta. O mecanismo é semelhante ao observado nos glaciares do arquipélago norueguês de Svalbard, no Oceano Ártico, onde a água fundida pelo calor do Sol interage com o enxofre atmosférico aprisionado no gelo, produzindo minerais de sulfato como a jarosite nas margens dos glaciares.

Podem ler mais sobre este trabalho aqui.

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Resolvido mistério da formação da maior bacia da Lua

Fossas tectónicas reveladas pela deteção de anomalias gravitacionais (sobrepostas a vermelho) na periferia de Oceanus Procellarum, uma extensa planície escura visível a olho nu no lado mais próximo da Lua.
Crédito: Kopernik Observatory/NASA/Colorado School of Mines/MIT/JPL/Goddard Space Flight Center.

Durante anos, os cientistas pensaram que a gigantesca bacia de Oceanus Procellarum, a maior alguma vez formada na superfície lunar, teria sido moldada pelo impacto de um asteroide, há milhares de milhões de anos. Um novo trabalho publicado esta semana na revista Nature, vem agora revelar novas evidências que apontam para uma origem radicalmente diferente. O estudo baseia-se em dados obtidos pela missão GRAIL, em 2012, e sugere que a formação desta extensa planície lunar poderá estar relacionada com um conjunto de estruturas subsuperficiais que flanqueiam a região num padrão retangular com interseções angulares.

"O lado mais próximo da Lua tem sido estudado ao longo de séculos, e, no entanto, continua a surpreender os cientistas que dispõem das ferramentas certas", disse Maria Zuber, investigadora principal da missão, e uma das coautoras deste trabalho. "Interpretámos as anomalias gravitacionais descobertas pelas sondas GRAIL como parte de um sistema de canalização de magma lunar - as condutas que alimentavam a superfície com lava durante as antigas erupções vulcânicas."

Oceanus Procellarum é uma extensa área localizada no lado mais próximo da Lua, caracterizada pela presença de baixas elevações, de uma abundância relativa de elementos radioativos e de numerosas antigas planícies vulcânicas. As duas sondas GRAIL mediram as alterações no campo gravitacional da Lua provocadas por variações na topografia e densidade da crusta sob a gigantesca bacia. O mapa revelou um conjunto de anomalias subsuperficiais lineares, que os investigadores interpretam como antigas fossas tectónicas preenchidas com lava. Estas estruturas teriam provavelmente uma morfologia semelhante à das zonas de rifte encontradas na Terra, em Vénus e em Marte.

A Lua, observada de três formas diferentes: aspecto em luz visível (à esquerda), mapa topográfico (ao centro) e gradientes de gravidade medidos pelas GRAIL (à direita).
Crédito: NASA/Colorado School of Mines/MIT/JPL/Goddard Space Flight Center.

"O padrão retangular das anomalias gravitacionais foi completamente inesperado", afirmou Jeff Andrews-Hanna, coinvestigador da missão GRAIL, e autor principal deste trabalho. "Usando os gradientes nos dados da gravidade para revelar o padrão retangular das anomalias, podemos ver agora claramente e completamente as estruturas que apenas podíamos adivinhar na observações da superfície."

Até agora, os cientistas pensavam que a bacia de Oceanus Procellarum tinha sido criada pelo impacto de um grande asteroide. A hipótese parecia ser apoiada não só pela sua topografia, mas também pela sua distintiva composição, que incluía concentrações relativamente elevadas de elementos como o urânio, o tório e o potássio, e pela presença de fragmentos de estruturas superficiais na sua periferia, que pareciam ser remanescentes de uma antiga orla montanhosa.

O padrão retangular das anomalias descobertas pelas sondas GRAIL vem agora contradizer esta hipótese. De acordo com os autores, foram os processos ocorridos abaixo da superfície lunar os responsáveis pelas características invulgares de Oceanus Procellarum. Andrews-Hanna sugere que a presença de uma elevada concentração de elementos radioativos no interior da bacia terá tornado esta área significativamente mais quente, e que o seu rápido arrefecimento e contração terá provocado a abertura de gigantescas fraturas nas regiões periféricas, o que contribuiu para a formação de fossas tectónicas num distintivo padrão retangular. O fenómeno ocorreu de uma maneira semelhante à de como se formam as fissuras na superfície de uma poça de lama quando esta seca.

O padrão das estruturas lunares parece ser surpreendemente semelhante ao das fraturas da região do polo sul de Encélado. Apesar das inúmeras diferenças entre as duas luas, ambos os padrões parecem estar relacionados com processos vulcânicos e tectónicos.

"Os nossos dados da gravidade estão a abrir um novo capítulo na história lunar, durante o qual a Lua era um local mais dinâmico que o sugerido pela paisagem crivada de crateras que é visível a olho nu", disse Andrews-Hanna. "São necessários mais estudos para compreendermos a causa deste recém-descoberto padrão de anomalias gravitacionais, e as suas implicações na história da Lua."

Podem encontrar mais pormenores deste trabalho aqui.

Marte... tão perto, tão longe

Marte e a Terra vistos da órbita lunar. A imagem foi obtida pela sonda Lunar Reconnaissance Orbiter a 24 de maio de 2014. São visíveis no nosso planeta o Oceano Atlântico, os continentes europeu e africano, e a península arábica.
Crédito: NASA/GSFC/Arizona State University/Sérgio Paulino (anotação).

Marte surge como uma pequena orbe brilhante, logo acima do nosso planeta, neste inspirador retrato captado a 24 de maio de 2014, pela Lunar Reconnaissance Orbiter, a partir da órbita lunar. Na altura, o planeta vermelho encontrava-se a cerca de 112,5 milhões de quilómetros de distância da sonda da NASA - o equivalente a aproximadamente 300 vezes a distância média que separa a Terra da Lua.

A dramática visão dos dois planetas a partir da órbita lunar insinua-se como uma lembrança do papel que a Lua poderá ter no futuro como ponto de partida para os primeiros exploradores de Marte e de outros destinos mais ambiciosos no Sistema Solar. Nas próximas duas décadas, a Lua poderá servir como plataforma de teste para a implementação de procedimentos e tecnologias essenciais na conquista e exploração humanas desses novos mundos hoje, ainda, tão distantes.

Podem explorar esta imagem na sua máxima resolução aqui (no final da página).

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Titã tem um vórtice polar frio e tóxico

Vórtice polar do hemisfério sul de Titã. A imagem da esquerda foi obtida pelo espetrómetro VIMS da sonda Cassini, a 29 de novembro de 2012. À direita podemos ver uma imagem em cores naturais, obtida pelo sistema de imagem da Cassini, a 25 de Julho de 2012.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/ASI/Universidade do Arizona/SSI/Observatório de Leiden e SRON.

Dados obtidos pela sonda Cassini revelaram que o vórtice atmosférico que paira sobre a região do pólo sul de Titã contém partículas de gelo de ácido cianídrico (HCN), um composto extremamente tóxico. A gigantesca nuvem tóxica foi observada pela primeira vez no início de 2012, logo após um dramático arrefecimento da atmosfera sobre a região.

"A descoberta sugere que a atmosfera do hemisfério sul de Titã está a arrefecer mais depressa que o que esperávamos", afirmou Remco de Kok, investigador do Observatório de Leiden e do Instituto Holandês de Investigação Espacial, e primeiro autor do trabalho publicado ontem na revista Nature.

Ao contrário de outras luas do Sistema Solar, Titã está envolta numa densa atmosfera composta essencialmente por azoto e por pequenas quantidades de metano. Tal como a Terra, a maior lua de Saturno passa por um ciclo de estações, cada uma com uma duração aproximada de 7 anos. A mais recente mudança sazonal ocorreu em 2009, quando o verão deu lugar ao outono no hemisfério sul, e a primavera sucedeu ao inverno no hemisfério norte.

Em Maio de 2012, imagens obtidas pela sonda Cassini revelaram a presença de um gigantesco vórtice pairando acima da região do pólo sul de Titã. O fenómeno parecia estar relacionado com a recente mudança de estação. Um detalhe intrigante acerca desta estrutura é sua altitude - aproximadamente 300 quilómetros acima da superfície de Titã, uma região na atmosfera que os cientistas pensavam ser demasiado quente para que as nuvens se pudessem formar. "Realmente, não esperávamos observar uma nuvem tão massiva a uma altitude tão elevada na atmosfera", disse de Kok.

Com o objetivo de compreenderem o que poderá ter estado na origem da misteriosa nuvem, a equipa de investigadores procurou indícios nos espetros de radiação solar refletida pela atmosfera titaniana. Usando dados obtidos pelo espetrómetro VIMS da Cassini, de Kok e colegas mapearam a distribuição de compostos químicos na superfície da nuvem. "A luz que parte do vórtice polar mostrou-nos uma diferença invulgar relativamente a outras porções da atmosfera", explicou de Kok. "Conseguíamos ver com clareza a assinatura de moléculas de HCN congeladas."

Na sua forma gasosa, o ácido cianídrico está presente na atmosfera titaniana apenas em quantidades vestigiais, pelo que a descoberta de partículas sólidas constituídas por esta molécula foi verdadeiramente inesperada. Em Titã, o ácido cianídrico condensa sob a forma de gelo, apenas quando a temperatura atmosférica atinge valores inferiores a -148º C. Este valor encontra-se cerca de 100º abaixo da temperatura prevista pelos modelos de circulação atmosférica para a atmosfera superior de Titã.

Para verificarem se tais temperaturas eram, de fato, possíveis, os investigadores pesquisaram as observações realizadas pelo espectrómetro CIRS da Cassini, um instrumento que mede as temperaturas atmosféricas a diferentes altitudes. Os dados mostram que o hemisfério sul de Titã tem estado a arrefecer com grande eficiência, o que tornou possível que se atingissem rapidamente as temperaturas necessárias para a formação da gigantesca nuvem sobre a região do pólo sul.

Por detrás deste rápido arrefecimento encontra-se, aparentemente, a circulação atmosférica, que tem arrastado para sul grandes quantidades de gás desde o equinócio de 2009. À medida que o ácido cianídrico aumenta a sua concentração nas latitudes mais meridionais, as suas moléculas brilham com maior intensidade na banda do infravermelho, o que provoca um efeito de arrefecimento na atmosfera em seu redor. Outro fator importante neste processo é a reduzida exposição do hemisfério sul à radiação solar, uma consequência da aproximação do solstício de inverno, que ocorrerá em 2017.

Podem encontrar mais pormenores deste trabalho aqui.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Marte visto pela MOM

O planeta vermelho, numa imagem obtida pela sonda MOM, a 28 de setembro de 2014.
Crédito: ISRO.

A ISRO divulgou uma nova imagem de Marte, captada no passado fim-de-semana pela sonda Mars Orbiter Mission (MOM), a uma altitude de 74500 km. A imagem encontra-se centrada em Meridiani Planum, uma antiga planície crivada de crateras. A leste podemos ver a cratera de Schiaparelli, com 459 km de diâmetro, as terras altas de Terra Sabaea e a cratera Huygens, uma cicatriz com 467 km de diâmetro. A sul de Huygens encontra-se Hellas Planitia, uma das maiores bacias de impacto do Sistema Solar, e a calote do pólo sul, enquanto que, para norte, podemos ver Syrtis Major, uma extensa mancha escura de origem vulcânica. No extremo norte, junto ao terminador, vêem-se densas nuvens de poeira de uma grande tempestade, que neste momento fustiga as planícies de Acidalia e de Chryse.