sexta-feira, 25 de abril de 2014

Meteoritos com suplemento vitamínico?

A investigadora Karen Smith preparando amostras de meteoritos para análise.
Crédito: NASA/Karen Smith.

Análises laboratoriais realizadas por uma equipa de investigadores americanos sugerem que os meteoritos ricos em carbono poderão ter sido uma fonte importante de vitamina B3 nos primórdios da formação da Terra. Os resultados foram divulgados na semana passada num artigo publicado na revista Geochimica et Cosmochimica Acta, e suportam a teoria que associa a origem da vida na Terra a moléculas orgânicas simples sintetizadas no espaço, e trazidas até ao nosso planeta pelo impacto de asteróides e cometas na sua superfície.

"É sempre difícil dizer até que ponto os meteoritos estão associados à origem da vida", afirmou Karen Smith, investigadora da Universidade do Estado da Pennsylvania, e primeira autora deste trabalho. "Por exemplo, estudos anteriores demonstraram que a vitamina B3 poderia ter sido produzida nos primórdios da Terra por processos não biológicos. No entanto, é possível que uma fonte adicional de vitamina B3 possa ter dado uma ajuda. A vitamina B3, também denominada ácido nicotínico ou niacina, é um percursor do NAD (Nicotinamida-Adenina-Dinucleótido), uma molécula essencial para o metabolismo, provavelmente, com uma origem muito antiga."

Esta não é a primeira vez que a vitamina B3 é detectada em meteoritos. Em 2001, uma equipa liderada por Sandra Pizzarello, da Universidade do Estado do Arizona, nos Estados Unidos, descreveu a presença de vitamina B3 e de outros ácidos piridinocarboxílicos em amostras do meteorito do Lago Tagish.

Neste novo trabalho, Smith e a sua equipa analisaram a distribuição e abundância dos ácidos piridinocarboxílicos em amostras de oito condritos carbonáceos do tipo CM-2 (meteoritos ricos em carbono), e descobriram que a vitamina B3 se encontra presente nestes meteoritos em concentrações entre 0,03 a 0,60 partes por milhão. A equipa de investigadores americanos encontrou ainda concentrações semelhantes de outros ácidos piridinocarboxílicos, e detectou, pela primeira vez, a presença de ácidos piridinodicarboxílicos em rochas espaciais.

"Descobrimos um padrão. Encontrámos menos vitamina B3 (e outros ácidos piridinocarboxílicos) em meteoritos provenientes de asteróides que foram mais alterados por soluções aquosas", disse Smith. "Uma possibilidade é que estas moléculas foram destruídas durante o contacto prolongado com água no estado líquido. Também realizámos experiências laboratoriais preliminares onde simulámos as condições presentes no espaço interestelar. [Estas experiências] mostraram que poderá ser possível a síntese de vitamina B3 e de outros ácidos piridinocarboxílicos em grãos de gelo."

Resíduo de uma experiência laboratorial que simula as condições presentes no espaço interestelar. Nesta amostra foi detectada a presença de vitamina B3 e de outros ácidos piridinocarboxílicos.
Crédito: NASA/Karen Smith.

O espaço interestelar encontra-se preenchido por radiação proveniente de estrelas próximas, de supernovas, ou da matéria devorada pelos buracos negros. De acordo com os cientistas, esta radiação poderá ter fornecido a energia necessária para desencadear reacções químicas na nuvem de gás e poeira a partir da qual se formou o Sistema Solar. Algumas destas reacções poderão ter produzido moléculas biologicamente importantes, como por exemplo, a vitamina B3.

Os asteróides e os cometas são considerados objectos primitivos remanescentes do processo de formação do Sistema Solar. Muitos meteoritos são amostras de asteróides, pelo que, potencialmente, exibem na sua composição moléculas que se encontravam presentes na nuvem primordial.

Porém, nem todos os asteróides se mantiveram inalterados ao longo dos cerca de 4,6 mil milhões de anos de história do Sistema Solar. Muitos sofreram alterações químicas logo após a sua formação. À medida que cresceram, alguns asteróides incorporaram materiais radioactivos em quantidade suficiente para que o calor gerado pelo seu decaimento aquecesse as suas entranhas ao ponto de derreterem o gelo de água presente no seu interior. Esta água líquida alterou consideravelmente a composição de alguns destes objectos, e deixou uma assinatura química e mineralógica que pode ser rastreada pelos cientistas.

Apesar dos meteoritos serem amostras de valor inestimável, raramente são recolhidos logo após a sua queda na superfície da Terra, pelo que ficam vulneráveis a contaminações proveniente da química terrestre ou da actividade biológica. Smith e a sua equipa duvidam que a vitamina B3 encontrada nas suas amostras seja de origem biológica.

Em primeiro lugar, a vitamina B3 foi detectada em simultâneo com os seus isómeros - moléculas com a mesma fórmula química, mas com um diferente arranjo estrutural. Estas moléculas não são usadas nem produzidas pelos seres vivos, pelo que não deveriam estar presentes nos meteoritos se a vitamina B3 resultasse de contaminação biológica.

Em segundo lugar, a abundância de vitamina B3 medida nos meteoritos é inversamente proporcional às alterações produzidas pela água líquida na química e mineralogia dos asteróides de origem. Esta correlação seria muito improvável se a vitamina B3 tivesse origem terrestre.

A equipa planeia realizar experiências adicionais que permitam perceber melhor como a vitamina B3 pode ser produzida em grãos de gelo, em condições semelhantes às presentes no espaço interestelar. "Usámos uma mistura gelada de piridina e dióxido de carbono na experiência inicial", afirmou Smith. "Queremos adicionar gelo de água (o componente dominante dos gelos interestelares) e partir de percursores orgânicos mais simples de vitamina B3 para nos ajudar a verificar a validade do nosso resultado."

Podem encontrar todos os pormenores deste trabalho aqui.

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