quinta-feira, 7 de julho de 2011

Anatomia de uma supertempestade em Saturno

A Cassini testemunhou em Dezembro passado o nascimento de um dos maiores fenómenos meteorológicos alguma vez observados no Sistema Solar: uma gigantesca tempestade no hemisfério norte de Saturno. Na sua posição privilegiada, a sonda conseguiu reunir dados preciosos para a equipa da missão reconstruir a sequência de eventos que estão na génese deste fenómeno. Os primeiros resultados dessas observações foram publicados hoje em dois artigos na revista Nature (ver aqui e aqui).

A supertempestade do hemisfério norte de Saturno em quatro imagens em cores falsas (3 filtros para o infravermelho próximo) obtidas pela sonda Cassini a 26 de Fevereiro de 2011. Os dois mosaicos de baixo estão separados por 11 horas (cerca de um dia saturniano).
Crédito: NASA/JPL-Caltech/SSI.

Os primeiros indícios do início da tempestade surgiram a 5 de Dezembro com a detecção de fortes emissões rádio com origem em Saturno pelo instrumento RPWS da sonda Cassini. Estas emissões estão associadas a descargas eléctricas na atmosfera saturniana e surgem geralmente como pequenos mas intensos picos de ondas rádio. Nesse dia, a frequência de relâmpagos foi tão intensa que os picos individuais se agruparam numa quase contínua emissão. Oiçam aqui os sons das descargas electrostáticas detectadas a 15 de Março, quando as emissões eram menos intensas e, consequentemente, com uma melhor resolução.
No mesmo dia, a equipa responsável pelo sistema de imagem da Cassini localizou no hemisfério norte um sistema de nuvens brancas brilhantes com 2.500 km de comprimento por 1.300 km de largura pairando a uma latitude de 32º. Alguns dias depois, astrónomos amadores em todo o mundo começaram a documentar a expansão de uma gigantesca tempestade na mesma região numa estrutura em forma de cometa.

A supertempestade três semanas após o seu início. Imagem em cores falsas obtidas pela sonda Cassini a 24 de Dezembro de 2010.
Dados obtidos pela sonda Cassini e por observatórios na Terra sugerem que a aparência cometária da tempestade se deve ao movimento convectivo de partículas de gelo de água e de amónia de nuvens profundas de água (a cerca de 250 km de profundidade) para a troposfera superior, região da atmosfera saturniana onde são arrastados pelos fortes ventos dominantes para leste.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/SSI.

Segundo a responsável da missão Carolyn Porco, é curiosa a localização da tempestade a cerca de 35º de latitude norte. Desde a sua chegada a Saturno, a Cassini observou apenas 10 tempestades com relâmpagos, todas localizadas a 35º de latitude sul, num estreito corredor apelidado pela equipa por "Alameda das Tempestades" (na Terra e em Júpiter, estas tempestades são mais frequentes e menos intensas). Agora que estamos em plena Primavera no hemisfério norte, esta violenta tempestade com intensas descargas eléctricas irrompe à mesma distância do equador mas no sentido oposto. Esta simetria não pode ser mera coincidência e tem estado a ser analisada em detalhe pelos cientistas da missão.
A supertempestade continua em actividade e não dá quaisquer sinais de abrandamento. Este mês será um dos alvos principais das câmaras da Cassini, pelo que iremos ter certamente em breve mais novidades sobre este belíssimo fenómeno.

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